segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Luiz Antônio Barreto


Publicado no Facebook/Fotos e Fatos da História de Propriá, 12.02.16.

Tributo a Luiz Antônio Barreto.
Por Marcos Melo*

Passados quase quatro anos de seu falecimento, ocorrido em 15 de abril de 2012, podemos constatar o enorme vazio que ausência de Luiz Antonio Barreto vem causando às nossas letras. Escritor, compositor, ator, historiador, sociólogo, folclorista, jornalista, produtor cultural e polemista instigante, LAB (sigla com a qual resumia seu nome), contraditoriamente, cresceu de importância na cultura sergipana, já que, como sói acontecer, em Sergipe e no Brasil, a morte leva ao esquecimento, mesmo daqueles que, em vida, contribuíram para o desenvolvimento da sociedade e da pessoa humana nas múltiplas atividades que dão sentido à existência.

A propósito, poetava o grande Nelson Cavaquinho numa de suas composições antológicas “quem quiser fazer por mim, que faça agora”. Nessa mesma tecla, bate o icônico educador e self-made Jouberto Uchôa quando discursa em homenagem a algum sergipano ilustre falecido: “homenageie em vida”, enfatiza sempre.

Essas lúcidas e oportunas ponderações desses dois sábios, bem atestam como é efêmera a memória nacional. Exemplarmente, o professor Uchôa prestou decisiva e comovente homenagem a LAB ao transferir para um local apropriado, na UNIT, todo o acervo do Instituto Tobias Barreto num momento de grandes dificuldades de manutenção desse rico repositório da história e cultura sergipanas. LAB estava disposto a alienar de qualquer jeito, já que nenhuma instituição pública se dispôs a adquiri-lo. Com o final feliz, confidenciava-me satisfeito: “Estou impressionado com Uchôa. Além de assumir o acervo, pessoalmente foi arrumá-lo nas estantes como se fora um simples braçal.” Ora, ora, como afirma João Augusto Gama, Uchôa é um case, um caso pra estudo. O trabalho, seja ele qual for, nunca lhe foi estranho. Hoje, o Instituto Tobias Barreto, obra do imortal LAB, da Academia Sergipana de Letras e da Academia Brasileira de Filosofia, continua prestando relevantes serviços à cultura sergipana num ambiente digno e condizente com seus objetivos, sob a supervisão da professora Raylane Barreto, sua dedicada esposa e companheira.

Sempre que me ponho a reviver passagens da minha convivência com LAB, me vêm à mente duas ocorrências que jamais esqueci. A primeira, quando o conheci em pleno átrio da Matriz de Senhor dos Passos, em Maruim. Corria o mês de maio de 1960 e a população trajada nas suas melhores vestes se concentrava na Praça Barão de Maruim, a principal da cidade, para participar da bênção do Santíssimo e saudar Sua Eminência Reverendíssima D. Armando Lombardi, Núncio Apostólico, que viera a Sergipe empossar D. José Brandão de Castro, primeiro bispo de Propriá.

Convidado do Cônego Afonso de Medeiros Chaves, um dos padres de D. José Thomaz, então pároco de Maruim e fraternal amigo de minha família, estava eu todo enfatiotado na minha domingueira participando da cerimônia no meio de todas aquelas autoridades civis, militares e eclesiásticas. A cada evento, a Euterpe Maruinense, sob a batuta do maestro Joaquim Santana, tocava um dobrado ou um hino sacro. Lá pelas tantas, o mestre de cerimônias Wilson Dias de Matos, o popular Alemão, parente do acadêmico José Lima de Santana, que anos mais tarde seria prefeito da cidade, anunciou o estudante Luiz Antonio Barreto para saudar o Núncio Apostólico, em nome do povo de Maruim, a pedido do prefeito João da Silva Lisboa.

Compenetrado, o estudante narigudo e magricela de 17 anos trajando a farda cáqui do Ginásio Maruinense dirigiu-se ao microfone e, pausadamente, como se já fora o profissional da palavra que viria a ser, soltou o verbo. Discurso de improviso denso e pleno de conteúdo sobre a formação histórica, econômica e social da cidade e por extensão da região da Cotinguiba, marcada pelas relações de produção da agroindústria canavieira. Encantou a todos, especialmente a D. Lombardi, pela precocidade, fala fácil e clareza das ideias. A vocação de LAB para a tribuna e para as Ciências Sociais estava ali perfeitamente delineada naquele histórico discurso, dizia-lhe sempre que rememorávamos aquela efeméride de que tanto ele se orgulhava.

Dez anos mais tarde, estava eu no aeroporto Santos Dumont, no Rio, de mala já despachada, pronto para embarcar no Electra II, da Varig, de volta à Aracaju. De repente aparece LAB com um pacote. Abraçamo-nos, pois há anos não nos víamos, ele então me pediu que levasse o pacote e o entregasse a Dr. Lourival Bonfim, seu sogro, residente na Praia 13 de Julho. E ficamos ali batendo papo enquanto o meu embarque não acontecia. Querendo saber de suas atividades no Rio, já que estava residindo na Cidade Maravilhosa, falou-me que estava muito satisfeito, trabalhando no Instituto Nacional do Livro, àquela época sob a direção do escritor Marques Rebelo, o festejado autor de A Estrela Sobe. Disse-me de seu entrosamento com a intelectualidade carioca, citando José Sanz, diretor do Museu da Imagem e do Som e figura de alta relevância na vida cultural da cidade, entre outras conhecidas como seu conterrâneo lagartense Joel Silveira, jornalista consagrado.

O fato é que, envolvido pela conversa prazerosa e cativante de LAB, esqueci-me de ir para a sala de embarque. Quando me dei conta, já era tarde: o avião havia decolado. Por diversas vezes, fui chamado a embarcar pelo serviço de som, disse-me a funcionária da Varig quando fui remarcar a passagem para o dia seguinte. Bilhete remarcado, fomos continuar a conversa no bar do aeroporto, regada a chope. Já era noite quando nos despedimos, indo então me arranchar no apartamento de Diogo Ramos, sobrinho do romancista Graciliano Ramos, fraternal amigo que conheci na Faculdade de Ciências Econômicas. LAB tinha uma conversa irresistível, capaz até de fazer alguém perder o avião; ou, quando dirigida às mulheres, ganhá-las. Era famoso seu poder de sedução.

Ocorrência importante na sua vida, que gostava sempre de relembrar, foi quando deixou Maruim e veio residir em Aracaju. Na Capital, em pouco tempo, já era personagem conhecida nos meios estudantis e intelectuais. No Colégio Tobias Barreto foi líder estudantil, militante de esquerda e agitador cultural. Logo se entrosou com o que havia de melhor nas artes, especialmente no teatro, aquela época sob a influência de dois dramaturgos excepcionais: os professores João Costa e Caetano Quaranta.

João Costa, autor, ator e diretor da emblemática peça Recital Sem Opus, de enorme sucesso nos palcos sergipanos e de outros Estados, premiada nos festivais de teatro de João Pessoa e Rio de Janeiro, foi personagem central no desenvolvimento das artes cênicas em Sergipe pela sua enorme cultura e dedicação ao teatro. Ao seu lado, como atores e colaboradores, os jovens João Augusto Gama, Chico Varella, Antonio Joaquim, Orlando Vieira que viria a ganhar o prêmio de melhor ator coadjuvante no Festival de Cinema de Gramado pelo seu magistral desempenho em Sargento Getúlio e LAB, autor da trilha musical de Recital Sem Opus, de que muito se envaidecia. Também participaram como músicos Sérgio Botto (piano), Edgar Silveira (violão e cavaquinho) e Paulo Amílcar (bateria). Considerada o auge da dramaturgia sergipana, Recital Sem Opus está completando este ano meio século de existência já que foi encenada pela primeira vez no palco do Teatro Ateneu em abril de 1966.

Ainda, por essa época, o já tarimbado intelectual LAB cria a revista Perspectiva, de grande significado cultural para as letras estaduais, tendo como colaboradores gente do quilate de João Costa, Alberto Carvalho, Thetis Nunes, Bonifácio Fortes, Silvério Fontes, Ariosvaldo Figueiredo, Garcia Moreno e outros luminares da cultura sergipana. Com enorme dificuldade de manutenção, Perspectiva teve apenas cinco ou sete edições, hoje exemplares de colecionadores. É bem provável que somente o Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e o pesquisador Jackson da Silva Lima possuam essas edições. Perspectiva, podemos dizer, é a ancestral da atual Cumbuca, revista moderna, bem editada, culturalmente avançada, idealizada pelo escritor e acadêmico Jorge Carvalho na sua brilhante passagem pela empresa pública Serviços Gráficos de Sergipe, a Segrase.

É, também, dessa época, o seu ingresso na histórica escola de jornalismo: a Gazeta de Sergipe, vespertino criado pelo icônico Orlando Dantas. Pode-se dizer que, na Gazeta, LAB ganhou régua e compasso, aprimorou sua visão crítica da sociedade e dos problemas sergipanos. De colunista, em pouco tempo se transformou em editorialista. Convém lembrar que o editorial da Gazeta e a crônica Nossa Opinião, da rádio Cultura, eram os dois grandes formadores de opinião naqueles anos sessenta. Ler pela manhã o editorial da Gazeta e ouvir, às 13:00 hs, Nossa Opinião era obrigação de quem queria estar bem informado.

Ao completar 50 anos, LAB foi homenageado pela intelectualidade sergipana numa concorrida solenidade no auditório do Tribunal de Justiça, quando foi saudado pelo escritor e acadêmico Manuel Cabral Machado, que longamente falou sobre a ilustrada trajetória do homenageado. Na oportunidade, lançou três livros um dos quais – Folclore: Um Roteiro de Alusões – faz uma alentada exegese sobre a cultura popular no Brasil, destacando o I Congresso Brasileiro de Folclore, realizado em 1951, no qual brilhou a figura do grande Câmara Cascudo.

Estudioso da cultura popular, LAB era um especialista nos embates entre mouros e cristãos que determinaram o feitio de nossas festas populares, especialmente no Nordeste: marujada, chegança, literatura de cordel e demais manifestações nativistas tiveram sua atenção de pesquisador e estudioso. Nesse sentido, foi íntimo de luminares nesses misteres como Gilberto Freire e Theo Brandão. Tinha profunda admiração pelo autor de Casa Grande e Senzala, que considerava um de seus mestres, tendo, nos anos oitenta, exercido a função de pesquisador da Fundação Gilberto Freire, então presidida por Fernando Freire, seu fraternal amigo e filho do renomado sociólogo. Seus saberes nessas áreas foram determinantes para a valorização de folguedos e de personagens que cultivavam e detinham a memória dessas tradições populares, como é o caso de Desidério, de Cedro de São João, exímio contador de estórias. Deve-se a LAB a criação do Encontro Cultural de Laranjeiras exatamente com a finalidade de debater, vivificar e fortalecer essas tradições que, no seu entender, contam a história de um povo.

A Filosofia também foi uma vertente do conhecimento que teve a atenção de LAB, certamente influenciada pelas leituras que fez de Tobias Barreto, seu herói e pai espiritual. Pode-se dizer sem medo de errar que LAB foi o maior e mais profícuo estudioso da vasta obra tobiática, adjetivo por ele criado para enaltecer o grande sergipano, primeiro filósofo social do Brasil. Tal dedicação o levou a pesquisar, sistematizar e editar as obras completas de Tobias Barreto em 10 volumes, sob os auspícios da Fundação Augusto Franco da qual foi diretor. Por conta desse fecundo trabalho, ganhou visibilidade nacional nos sodalícios filosóficos, vindo a tomar assento na Academia Brasileira de Filosofia, tendo como seus pares Vamireh Chacon, Miguel Reale, Antonio Paim e outros pensadores de nomeada.

Nos anos 80, com o apoio da Confederação Nacional da Indústria, então presidida pelo senador Albano Franco, concebeu e concretizou o Colóquio Antero de Quental, com a finalidade de reunir filósofos brasileiros e portugueses para debater os avanços da Filosofia no Brasil e em Portugal, com reuniões semestrais em Aracaju e Lisboa. Ainda na direção da Fundação Augusto Franco editou a Obra Escolhida e os poemas A Ode e o Medo e Pentáculo do Medo do poeta órfico Santo Souza, além da citada obra de Tobias Barreto entre outros intelectuais sergipanos.

No serviço público o poliédrico LAB foi o primeiro Secretário de Estado da Cultura no governo Albano Franco, tendo se destacado na estruturação da novel secretaria e no apoio aos grupos e iniciativas produtores de cultura popular na música, no folclore, nas artes cênicas, nas artes plásticas, nos folguedos tradicionais e nas festas religiosas. Foi, ainda, no governo Albano Franco, Secretário de Estado da Educação e nesse cargo criou o Programa de Qualificação de Docentes que, em convênio com Universidade Federal de Sergipe, promoveu a especialização e titulação de milhares de professores que não tinham o curso superior, o que proporcionou a instalação do Ensino de 2º Grau em todos os municípios sergipanos.

Nos últimos anos LAB foi um assíduo frequentador e ativo participante da reunião do Conselho Regional de Economia - Corecon onde se reuniam profissionais de diversas categorias nas noites das segundas-feiras para debater problemas estaduais, regionais e nacionais de diversos matizes, sob a coordenação do engenheiro Luiz Eduardo Magalhães; lá se reuniam, e ainda hoje se reúnem, agora na Sociedade Médica de Sergipe, Hamilton Maciel, Dilson Menezes, Paulo Brandão, Nilson Lima, Manoel Vasconcelos, João Ricardo Magalhães, Anselmo Oliveira, José Padilha, Antonio Samarone, Antonio Saracura e outros menos assíduos como eu, mas por residir em Brasília. Atualmente nominada de Fórum Luiz Antonio Barreto, numa homenagem e como forma de preservar a memória deste grande sergipano, essa congregação continua ativa e discutindo temas de relevância atual.

Podemos, enfim, afirmar que Luiz Antonio Barreto continua vivo na memória dos sergipanos, nesse Fórum que tem o seu nome, no Instituto Tobias Barreto, nas diversas homenagens que lhe são prestadas, a exemplo da que fez o ano passado a Associação Sergipana de Imprensa e a Câmara de Veadores de Aracaju pela iniciativa de seus presidentes, respectivamente Cleiber Vieira da Silva e Vinicius Porto e, nesta última, mas não a definitiva publicação, também patrocinada pela Associação Sergipana de Imprensa.

(*) Economista e Advogado. Presidente da Academia Propriaense de Letras, Ciências, Artes e Desportos – APLCAD e Membro da Academia Sergipana de Letras – ASL.

Texto e imagem reproduzidos do:
Facebook/Fotos e Fatos da História de Propriá.

Orlando Dantas

Foto postada por MTéSERGIPE, a fim de ilustrar o presente artigo.
Imagem de arquivo de Paulo Roberto Dantas Brandão.

Publicado originalmente do site do Portal Infonet, em 26/03/2005.

Um usineiro socialista*

Pode um homem moldado pela sociedade patriarcal representativa da cultura dos engenhos, filho e neto de usineiros, tornar-se socialista? Mesmo que a resposta seja negativa, quem há de negar que Orlando Dantas tenha sido a personificação mais bem acabada dessa metamorfose teoricamente impossível? Dentro de 15 dias, faz 23 anos da morte de Orlando Vieira Dantas (ele nasceu a 28.9.1900 e morreu a 9.4.1982), um homem contraditório, polêmico, mas que viveu à frente do seu tempo.

Nascido e criado no cenário atrasado de um engenho nordestino, e durante toda a vida proprietário de usina de cana-de-açúcar, ele foi, além de militante socialista, um político nacionalista e, acima de tudo, um jornalista de posições intransigentes na defesa da economia de Sergipe e quase sempre radicais contra a ditadura e a opressão. Fez da Gazeta de Sergipe a trincheira principal para seus embates e um campo aberto para a divulgação das variadas manifestações da sociedade. Foi, sem medo de errar, o principal nome da imprensa sergipana no século XX.

"Não se contentou Orlando Dantas na atuação de empresário progressista e bem sucedido. Buscou caminhos do jornalismo e da política, agindo de forma destemida e inconformada, denunciando as arbitrariedades do poder, as injustiças sociais, na defesa de um mundo mais justo e mais humano", escreveu certa vez a historiadora Maria Thetis Nunes. Esta e a também professora da UFS Amy Adelina Coutinho de Faria Alves chegam a considerar Orlando Dantas um cientista social, autor de livros sobre a vida em engenhos de açúcar, dentre os quais destacam A Vida Patriarcal de Sergipe. Mas, observam, ele era um usineiro, filho de senhor de engenho, que viveu com escravos emancipados e carregava raízes profundas da sociedade patriarcal.

BIOGRAFIA RESUMIDA

Orlando Dantas nasceu no Engenho Palmeira, em Capela, e era filho de Manoel Corrêa Dantas, que foi presidente de Sergipe (1927-30). Ainda jovem começou a dirigir a Usina Vassouras, em Divina Pastora, depois Capela. Antes, em 1927, já demonstrava seus dotes jornalísticos-literários quando tentou fundar um jornal chamado "Gazeta de Sergipe", mas fracassou. Em 1929, no governo do pai, já bem relacionado com os ferroviários, durante uma greve, conseguiu evitar o confronto armado entre aqueles e a polícia. Em 1944, foi um dos fundadores do jornal O Nordeste e escreveu o livro O Problema Açucareiro de Sergipe.

Em 1945, participou da fundação da Esquerda Democrática em Sergipe, pela qual se elegeu deputado estadual constituinte em 1946. Nesse mandato, teve coragem de protestar contra o fechamento do Partido Comunista. De 1951 a 1955, foi deputado federal pelo Partido Socialista Brasileiro, quando se notabilizou pelo forte nacionalismo. Não só foi uma das vozes mais ativas na Câmara pela criação da Petrobras, como foi um dos responsáveis pela instituição do monopólio estatal do petróleo, só recentemente revogado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em 1956, fundou a Gazeta Socialista, jornal que enfrentou forte resistência da elite sergipana, tendo à frente o PSD e até a UDN que ele ajudou a fundar e na qual esteve abrigada a Esquerda Democrática antes de transformar-se em PSB. Em 1958, surge a Gazeta de Sergipe, primeiro jornal diário de Aracaju, após desvincular a Gazeta Socialista do Partido Socialista. Em 1962, Orlando Dantas apoiou a eleição de Seixas Dória ao governo de Sergipe e tornou-se um feroz crítico do regime militar depois que o governador foi deposto. Logo após o golpe, o jornal chegou a ser empastelado.

Mas cometeu sua mais grave contradição política ao filiar-se à Arena, partido do governo militar. Ibarê Dantas (A Tutela Militar em Sergipe, 1997) registrou assim: "...depois de rejeitar em 1966 o convite para integrar o MDB, em 1969, no auge das repressões, o velho guerreiro da imprensa sergipana entrava no partido situacionista com a pretensão de renovar a política estadual. Em manifesto explicava ao povo sergipano: ‘Escolhi a Arena (...) por julgar o processo político democrático mais consentâneo com os divergentes grupos do PSD, UDN e PR e pelas menores resistências às reformas impostas pela Revolução. Essa reforma possibilitará mudança de mentalidade política’". Arrepende-se depois e nunca mais filiou-se a outro partido político. Em 1974, publicou o livro Política de Desenvolvimento de Sergipe. Em 1980, dois anos antes de morrer, num derradeiro ato de coragem, publicou o seu mais importante livro, A Vida Patriarcal de Sergipe.

VIDA PATRIARCAL

O livro de Orlando Dantas — diga-se, autobiográfico — é praticamente escrito sobre exemplos da dominação masculina em Sergipe desde o período colonial. Ele reconstitui a árvore genealógica de sua família, lembrando que a tradição dos senhores de engenho tem origem na época dos primeiros portugueses que se instalaram nas terras de Sergipe para explorar a economia açucareira. Um capítulo é dedicado ao pai do autor, Manoel Correia Dantas, nascido no engenho Mouco, em Santa Rosa, distrito de Itabaiana, em 22 de dezembro de 1874, cunhado do senador José Luiz Coelho e Campos, que vinha a ser padrinho de Orlando.

Tentando se colocar no lugar do espectador, Orlando Dantas comete desvios. Ao contrário do que supunha, o patriarcalismo não é uma estrutura pretérita. O sociólogo espanhol Manuel Castells (O Poder da Identidade, 1999) lembra que o "patriarcalismo é uma das estruturas sobre as quais se assentam todas as sociedades contemporâneas". A socióloga feminista Heleieth Saffioti (O Poder do Macho, 1987) chega a estabelecer uma simbiose do patriarcado com o racismo e o capitalismo que garante a permanência do primeiro: "...o patriarcado é o mais antigo sistema de dominação-exploração. Posteriormente, aparece o racismo, quando certos povos se lançam na conquista de outros, menos preparados para a guerra. Em muitas dessas conquistas, o sistema de dominação-exploração do homem sobre a mulher foi estendido aos povos vencidos. Desta sorte, não foi o capitalismo, sistema de dominação-exploração muitíssimo mais jovem que os outros dois, que ‘inventou’ o patriarcado e o racismo. (...) Com a emergência do capital, houve a simbiose, a fusão, entre os três sistemas de dominação-exploração".

Mas, a propósito, o sociólogo francês Pierre Bourdieu (A Dominação Masculina Revisitada, 1998) observa que qualquer um pode cometer desvios ao tentar compreender o patriarcado. "Quando tentamos pensar a dominação masculina, corremos o risco de recorrer ou nos submeter a modos de pensamento que são, eles próprios, produtos de milênios de dominação masculina. Queiramos ou não, o analista, homem ou mulher, é parte e parcela do objeto que tenta compreender. Pois ele ou ela interiorizou, na forma de esquemas inconscientes de percepção ou apreciação, as estruturas sociais históricas da lei masculina". O reparo vale como defesa de Orlando Dantas, alguém que como empresário, político, jornalista ou factótum de sociólogo teve coragem de remexer nas estruturas sobre as quais se criou e esteve assentado.

* "Orlando Dantas, um usineiro socialista" é o título de um projeto de pesquisa apresentado ao curso de Mestrado em Sociologia da Universidade Federal de Sergipe no ano 2000.

Texto reproduzido do site: infonet.com.br/noticias/politica

Célio Nunes da Silva (1938 - 2009)



Publicado em 10 de março de 2004 por IMD Instituto Marcelo Déda.

Vida e obra

Correndo nas veias o sangue de José Nunes da Silva, operário gráfico e líder sindical entre as décadas de 20 e 50 e início da década de 60, e da professora Júlia Canna Brasil e Silva, Célio Nunes nasce num ambiente de militância política acariciado pelo universo das letras.

Na adolescência, estudante do Atheneu Sergipense, ingressa na União da Juventude Comunista, tornando-se na década de 50 dirigente do Partido Comunista Brasileiro, o Partidão. “Na fase da adolescência firmei o desejo, a aspiração der ser jornalista, escritor. É o que fui, e continuei sendo e vou morrer sendo, exercendo principalmente o jornalismo, profissão que adotei e sobrevivi com ela”, diz Célio.

Durante o período de 13 anos viveu na Bahia, onde trabalhou no jornal Tribuna da Bahia, Salvador, além de outros da região, mantendo sua vida de militância política e cultural junto com o irmão jornalista Hélio Nunes. Em Itabuna, tinha um grupo de teatro e literatura que irradiava cultura a sociedade, quando em 64 foi preso e seu irmão perdeu a gráfica, desestruturando toda a família. “Não sofri tortura física, apenas psicológica, traumática até certo ponto, mas já estava preparado”, diz.

“Em Itabuna publiquei meus primeiros livros, e minha vocação desde o início era ser ficcionista, tanto que a área que gosto mais e pratico é a ficção através do conto, histórias curtas”, ressalta o escritor que não se prende a estilos e busca, nas reminiscências da infância os personagens de seus contos.

De volta a Aracaju, dá continuidade às suas atividades essenciais e prazerosas: política, sindicalismo, fundando nesse período o Sindicato dos Jornalistas, do qual foi presidente por duas vezes. Junto com José Eugênio de Jesus começou a exigir a regulamentação da profissão, a incentivar o curso de jornalismo e registrar pessoas que já praticavam a profissão. “Gerou muita polêmica, mas dei a minha contribuição ao sindicalismo. Também fui diretor da Federação Nacional de Jornalistas e presidente da Associação Sergipana de Imprensa”, ressalta Célio Nunes.

Na Gazeta de Sergipe foi redator, no Jornal da Cidade redator e editor, e no Jornal da Manhã atuou nas três funções: redator, editor e diretor. Editando o caderno de cultura Arte e Palavra, no JM durante três anos, marcou história e hoje serve de fonte de pesquisa cultural, segundo suas próprias palavras, deixando transparecer saudosismo do tempo em que o suplemento cultural era direcionado aos meios intelectuais de todo o Brasil. “Foi uma das realizações mais gratificantes que o jornalismo me proporcionou e pelo qual me responsabilizei”, declara.

Hoje o homenageado atua como colaborador do jornal Cinform, não retornando à atividade diária das redações, permanecendo em casa praticando suas preferidas atividades: ler e escrever contos. “Nesse tempo de recolhimento, fico escrevendo e lendo, pois são as coisas que mais gosto de fazer. Tenho três livros escritos, inéditos, um de crônica e dois de ficção”, declara, passando o olhar sobre O Diário de J. W. e outras histórias, no qual, em um dos contos deixa que o leitor escolha o seu final, disponibilizando cinco alternativas à imaginação e conclusão de cada um.

Fonte: institutomarcelodeda.com.br

Paulo Fernando Teles de Morais


"Paulo Fernando Teles Morais nasceu em 1941, na usina Pedras, em Maruim (SE). Jornalista, escritor, licenciado em Letras Vernáculas pela Universidade Federal de Sergipe, trabalhou no Banco do Brasil, onde se aposentou. Foi correspondente da revista VEJA e do jornal O GLOBO, e editor do JORNAL DA CIDADE, de Aracaju. Torcedor do Fluminense do Rio de Janeiro e do Confiança, de Aracaju..." (Fonte: Jornal da Cidade).

Foto reproduzida do Facebook/Paulo Fernando Morais.
Curtidas/comentários em post originário do Facebook/GrupoMTéSERGIPE.

Murillo Melins


Murillo Melins nasceu em Neópolis, antiga Vila Nova, em 22 de outubro de 1928, radicou-se em Aracaju, trabalhou nos correios e é funcionário público (auditor municipal) aposentado. O memorialista é autor de “Aracaju Romântica que vi e vivi”.

Murillo Melins se descreve como um “verdadeiro contador de histórias” e revelou aspectos particulares da capital de antigamente. “As pessoas acordavam com o canto do galo, era uma cidade muito calma, íamos dormir muito cedo também”, diz. Murillo descreve com maestria a Aracaju das décadas de 1940 e 1950.

Segundo o falecido intelectual Luiz Antônio Barreto, Murillo Mellins realiza um trabalho incansável que o fez curador das memórias aracajuanas.